Da Natureza da Realidade
A História é uma das
matérias de registo, além da estatística e das ciências, pelo percurso da sua
evolução. Mas a mãe da memória da Humanidade e até dos ambientes e dos meios
naturais é a História. Essa mãe, matriarca da Memória, é porventura a parente
pobre, paradoxalmente dos percursos muitas vezes felizes e bem sucedidos da
nossa evolução como espécie, outras tantas, infelizes, demolidores do que antes
fora construído e testemunha da novos ciclos de atraso evolutivo.
É pela História que
podemos tomar conhecimento do mundo que nos antecedeu, é a ela que, noutros
momentos, ou alguns de nós depositam a maior indiferença. Eventualmente, a
História devia ser um repositório de verdades, boas e más. Frequentemente ela é
usada para favor um favor aos amantes da mentira.
E a verdade, como sabemos,
dificilmente é uma. E na História se misturam, intencionalmente, essa
dificuldade de relatar uma verdade, ou usar a mesma dificuldade de a identificar,
para transmitir uma herança de mentiras. E não é, como se imagina, nada
inocente essa manipulação da verdade. Mas ela, verdade, tem uma natureza. E
desse natureza, se trata, afinal, a busca constante de soluções para a genuína
evolução humana.
E verdade sobre o
bem-estar de um povo, não é indiferente às consequências o uso de mentira. A
natureza dela, está presente, ou esteve, apenas pode ter sido usada para fins
mais ilícitos. A natureza da realidade, uma forma física de Verdade não é
escamoteável. A visão que temos dela, porém, transforma-a quase no seu oposto,
no limite. E a História é quem sofre, a Humanidade quem vive as consequências.
É assim com factos e
falsos factos políticos. É assim com factos e pseudo factos culturais e até
científicos onde a documentação rigorosa e adequada das suas descobertas e dos
seus avanços deveria eliminar erros de verdade.
Uma das áreas onde a
verdade tem tantas faces que difícil se torna identificar sem titubear a
realidade, para além do relato da mesma é, obviamente a política. Uma tradição
de negociação política, dita diplomacia, para gozo do assunto, rica em jogos de
falsas verdades e mentiras nunca assumidas, remonta a Mazarin e a Maquievel,
pelo menos de forma documentada e transposta para a História.
Mas a literatura também
tem dado, desde sempre a sua contribuição para nublar a realidade, ou a
transformar numa verdade oposta aos factos.
O uso da inteligência
humana para os fins ilícitos conhecidos de transformação da realidade foi quase
transformado em arte, dando origem à expressão “maquievélica” e levando ao
extremo as consequências políticas, até à implantação de ditaduras com esmagador
apoio popular.
Dois aspectos que se
prendem com o processo da mentira são, do ponto de vista das ciências da mente,
fascinantes. O processo mental seja ele qual for tem uma natureza química e tem
uma outra estruturada a nível psicológico. Se alguém mente, conscientemente,
como se pressupõe ser a mentira, tem de saber enganar o registo mental de
factos, trabalhá-lo e traduzi-lo numa outra visão da realidade que é
reconhecido pela mente como sendo falso. Os pensamentos são sempre “materializados”,
ou seja, um processo, como tal algo existente e positivo. Pode existir uma
negação objectiva e intencional de um pensamento, mas não um pensamento
negativo, dito inexistente. Uma transformação da verdade, eufemismo para
mentira, é uma ludibriação da realidade, tal como a mesma mente que produz a
mentir a reconhece. Um processo provavelmente custoso e que, a dada altura pode
até alterar o registo da verdade, assumindo a mentir em seu lugar. É o que
acontece quando dizemos que alguém “acredita nas suas próprias mentiras”.
A nível mais pessoal e
intimista, ou íntimo mesmo, os sentimentos podem ser desmentidos pelas
expressões, pelo tom da sua transmissão, pelos factos resultantes e contraditórios,
pelo acto sexual, espécie de polígrafo feito com o corpo humano. Mas a outro
nível, social, a dificuldade de se entender a própria natureza da verdade, ou
seja, da realidade, é bem maior.
Acontece com frequência
com a actividade política, muito mais do que com a empresarial, porque a prova
dos factos é, também frequentemente de difícil demonstração. Em parte porque a
política é da área filosófica e não apenas do nosso quotidiano. Em parte,
também, porque há toda uma preparação e escola, até, de exercício de
falseamento da realidade. Interessa ao objectivo primeiro de chegada ou
manutenção do Poder. E é este simples facto que muitas vezes se ignora, ou
pretende ignorar. O mesmo facto que permite dar-se a um partido de um extremo
político um voto à borla, uma oportunidade de exercício de falácia e de
mentira. Uma dessas falácias é a de que da Esquerda vêm boas intenções e ideias
benéficas aos com menos oportunidades. Outra, complementar, a de que da Direita
vem sempre algo com um interesse obscuro e prejudicial latente. Nestes tempos,
essa tentativa de mascarar a realidade é assunto melindroso, mas de capital
importância. E os olhos abertos, por vezes, pode se muito escasso.
Comentários