O nosso tempo...



Que somos feitos de nadas, já é frase feita. Que somos levados pelas nossas emoções, mas conduzidos pelas de outros, é fruto de uma aprendizagem que, a custo e alguma dor, nos deixa arrastar ao ponto de uma sabedoria acrescida que, esperamos, um dia nos possa proteger. Nos impedir de voltar a cair em erros de que o passado nos marcou. 

Somos tão voláteis que, na nossa segurança cega e muda, pensamos não sermos susceptíveis. E, no entanto, voltamos ao mesmo ponto, ou local onde o crime deixou marcas, tantas vezes quantas as da nossa abertura à mesma vontade, ao mesmo instinto, até, de nos deixarmos levar… 

Foi assim que vezes e vezes me deixei levar… 

Bem, não foram tantas, mas foram profundas, sérias, se acharem mais adequado. Não vou litigiar-me por palavras. Não me interessam discussões sobre significados. Interesso-me por conteúdos, pelo recheio que dá cor, vida e beleza às palavras. 

No nosso meio, somos todos feitos do mesmo. A mania da racionalidade já nos abandonou há gerações e gerações. Agora somos os realistas da emoção. Sabemos que iremos cair nessa armadilha repetida e tristemente. Mas caminhamos para cada uma com a mesma alegria pueril. Esta inocente ingenuidade, deixe-me passar este pleonasmo, também ele inocente, para vos dar parte do meu testemunho pessoal. Depois, bem podem chamar-me lamechas, ou pinga amores. Já não ligo a essas críticas ou julgamentos, vindos de pessoas, pois os humanos não entenderão nunca o nosso mundo. 

Comigo foi sempre assim. Entrega total. Não de uma vez. Isso, quando ainda tinha outras pilosidades, ou as asas me permitiam voos bem mais arrojados. Agora, que cada batimento me custa mais do que a um humano o insistente fôlego da vida, feito ritmo no seu pobre coração…agora, já só voo por dentro. Mas parecem voos bem mais longos, demorados, que precisam de mais preparação e esforço. Alías, voo...mas já me dou ao luxo que escolher com quem.. 

Pois, entrego-me! E depois, assim que se me descolam as asas, da imaginação, pois, começam as ilusões e, com elas ao mesmo batimento, na mesma música e letra..o sofrimento. 

Entreguei-me e…da primeira, ficou-me uma profunda cicatriz, que talvez só me permita um movimento de uma asa, da segunda…é dessa que vos quero agora falar… 

Ela, ai…linda, talvez mais por dentro, mas por fora..não linda, mas uma beleza, beleza alva… e que voos ela fazia. E que outros me provocava, provoca, ainda, a mim, que sempre me julgo seguro! 

Mas foi só por dentro que voei. Por fora, só ela, E eu apenas me deixei ficar a ver. E de tanto ver…que comecei a ver o que não queria. Que ela…não me via, pelo menos como os olhos que eu tinha, tenho, para ela. 

O resultado? Nos voos dela, eu fiquei tão só, a olhá-la, na sua branca tessitura e brilhante postura. Na sua flamejante atitude, de luz interior feita. Na sua segura caminhada, nos seus voos esbeltos, mas nos quais eu não entrava. Agora, neste mesmo momento em que vos confesso, a vós, indiferentes humanos insensíveis, estará ela a voar, numa dança eterna de beleza divina, de música celestial, mas não para os meus olhos e muito menos para as minhas pobres asas. 

Neste momento, este voo, eu o perdi. Decerto. Mas uma coisa os homens me ensinaram: a guerra ganha-se na última batalha. E ainda tenho essa esperança e o desejo reforçado, de o último voo, a mais bela e perfeita das danças, ser meu. Ser nosso! 

Aqui me fico, pois, preparando e se as asas não me chegarem para o concurso com esse outro - nem de asas mais fortes, nem mais belas, nem melhores dotes para voar, mas isso desconfio quem a minha princesa branca não o sabe...- que este voo me arrebatou, esta princesa dos ares me levou, mas só por momentos, então com a sabedoria que conseguir, e que sei ter, voaremos os dois se não por fora, por dentro. Que pedura mais. E tal será a nossa força conjunta e imenso desejo que o voo exterior e único, nunca antes visto, será só nosso. E virá antes ou com o voo interior, do sentimento. Esse voo nem será o último, mas o início de muitos, e será uma dança, um tango e um abraço sensual. 

O ar pertencer-nos-á 

É o leve manto envolvente da nossa paixão que está por vir!

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