O "crime" de querer ser livre ou a violência inaceitável de uns sobre outros



Desde o dia 24 de Fevereiro que vivemos diariamente, à confortável distância que não nos permite ouvir, sentir, cheirar e ver o genocídio de um povo que cometeu o crime de um dia pretender ser livre.

Ser livre, evoluído, viver com conforto económico e querer determinar o seu dia e o seu futuro, são opções inaceitáveis para quem tem derivas totalitárias assumidas, ou é assumidamente ditador. Seja-o ou não, basta defendê-los, aos ditadores.

Para alguns "democratas" que se auto consideram de superioridade moral, "todas as ideias são legítimas, mesmo as que são contra um regime ou modo de vida democrático (há modos de vida democráticos em regimes com muito défice de democracia!).

O horror impensável, que nos choca, que se evita ter a todo o momento presente, que até já deve cansar alguns de ver, pelo conforto de noticiários, que se vive na Ucrânia, país que sonhou um dia com a Liberdade e com a Prosperidade, o horror e o medo constante, imposto por um regime que não conheceu até hoje praticamente mais do que uns meros meses de tentativa democrática, é algo que...não é algo, é exactamente a pior situação em que qualquer ser humano normal nunca se imaginaria, e para o que nunca se está preparado.

Mas imaginem, porque é um exercício (no caso meramente intelectual e no tal conforto que a paz nos permite) que considero importante, ou mesmo fundamental, que vive numa cidade onde um dia acorda e sai à rua com misseis a destruir tudo à sua volta... conhecidos a serem abatidos pelo fogo que chega do ar, ou pelos canhões de veículos blindados... à sua volta, os vizinhos, os familiares mesmo, estão ou a qualquer momento poderão estar mortos! Os nossos conhecidos e amados, desaparecidos desta vida pela violência de uma potência que não tolera a Liberdade nos outros. Simplesmente não aceita e não tolera a Liberdade, por um básico e animal ódio a tudo o que é diferente do regime de horror e violência vigente nesse país, país de muitos ódios e de violências ancestrais. Porque parece que há países em que a violência é uma tradição, uma cultura, um modo de vida, e nada nem ninguém pode considerar-se a salvo.

Acordar com o som dos obuses, o estrondo da destruição, o cheiro da morte, em qualquer lado à nossa volta, em todo o lado a qualquer instante. Num instante que não se pode antever, e a morte dos nossos nos invade a nossa própria frágil condição de vida.

Quem pode tolerar isto? Quem pode viver um dia a dia com isto? Quem consegue encontrar argumentos que defendam um horroroso e inqualificável "direito ou legitimidade" da destruição de um país e de um povo, por outro, melhor, pelo regime de outros?

E é então possível que se aceite todas as ideias, mesmo as que defendem o fim eventual, mas sempre desejado e projectado até, fim do nosso modo de vida, das nossas tais ideias e postura tolerante?

Não consegue, um certo indivíduo que hoje é um dos "responsáveis" da nação entender como se vota contra o discurso do Presidente do país invadido e destruído pelos assassinos vizinhos, mas consegue aceitar ideias mesmo as que são contra o nosso modo de vida, pretensamente democrático. Por uma tomada de posição que a personalidade considera de uma moralidade superior? Um indivíduo é vítima, amarrado a um poste, de um torturador que sabe que lhe irá retirar a vida, mas aceita que o outro, o torturador assassino lhe explique a razão porque entende que o quer matar...

Mas o ponto não é o indivíduo menor, inferior que se sujeita a uma ideia tão estúpida quanto esta, mesmo quando a personalidade é agora a "segunda da nação" (quase todas, as eleitas mesmo...não poderão nunca almejar o respeito democrático dos seres normais, por comprovado compadrio com o atraso e empobrecimento nacional assumido, institucionalmente assumido, "porque os portugueses votaram maioritariamente nessas gentes...e quero lá eu saber de respeitar quem anda há cinco décadas a destruir o meu país e a me retirar o direito de que não abdico, e de nada me serve, de ser tão digno de uma vida sem sacrifícios como se fosse um europeu...!).

O ponto é o que importa. E o que importa, mesmo, é o medo e o risco de perda de vida permanente, de cada um dos indivíduos que um dia sonharam serem livres e terem futuro. O ponto, o grave e tristemente memorável ponto é a violência gratuita e animalesca que um país autocrático leva a outro. E mata, mata muito, mata todos os dias e deixa tudo ao nível do chão, ou abaixo dele, em covas comuns.

Nem importa que cada um de nós não imaginasse um dia vir a presenciar uma guerra assim, uma qualquer guerra em antes sereno e próspero território europeu, uma invasão por assassinos selvagens e inumanos.

Importa apenas o que lá se vive. Ou se morre. Todos os dias, qualquer um deles. 

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