Carlos Ruiz Zafón, Marina: “Marina disse-me uma vez que apenas recordamos o que nunca aconteceu”…”O tempo não nos torna sábios, apenas mais cobardes”.
O protagonista desta história termina o seu relato com esta visão do antigo colégio interno, com a noção de que se voltasse a visita-lo se perderia a sua juventude ( a memória dela). A memória da própria história. Uma história única, comovente, de fim triste. Mas rica de emoções. Como nunca chegou a concretizar o sonho que a história desenvolve, de que a sua melhor ou única amiga, se tornasse, um dia, a sua namorada e companheira, com quem tantas aventuras e emoções havia vivido….recordava então, apenas, o que nunca aconteceu.
Mas numa outra dimensão, as palavras de Marisa, a sua heroína que teve um fim sereno, mas triste e prematuro, o que nunca aconteceu refere-se à incerteza e ao irrealismo, ou realidade inverosímil da aventura conjunta e da história que lhes for a contada e que acabariam por partilhar e viver.
Lê-se de um fôlego, este pequeno romance de Ruiz Zafón. Fica-se, no fim, com o sabor doce da sua prosa que cedo nos abandona, e do sal de alguma lágrima que nos pode fazer verter.
Curioso como as lágrimas que libertamos pelas histórias dos outros nos fazem reviver as nossas próprias. Nem sempre de tristeza, ou angústia, mas de nostalgia. Como se nesse efémero percurso de uma isolada lágrima, se pudessem repassar todas as nossas próprias histórias, concluídas ou, especialmente inconclusivas, e nos ficasse, no fim, o mesmo sabor amargo, que a história que acabámos de ler, nos deixa, também. Com uma pequena lágrima, assim vertida, chega-nos o impulso de regressar aos nossos passados, desde a infância e a todos os momentos e vidas, que quisemos viver de uma ou outra maneira, dos incompletos percursos que apenas iniciámos, mas que sabemos bem, não nos podíamos permitir revisitar. E nisso reside, afinal, a beleza poética, da nossa breve nostalgia. Há coisas que não se podem, nem queremos revisitar, e que devemos deixar como estão, e algumas nem sabemos se estão ainda, ou existem. Apenas as levamos connosco, desde o dia ou o momento em que demos um passo para o lado e entrámos num novo caminho.
E assim recordamos o que…nunca aconteceu.
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