O Maior sentimento do Mundo. O maior e o pior.


Eu não pensava escrever algum dia em discurso directo. Num breve e pouco proficiente curso de escrita criativa, cujo ónus a mim apenas respeita, não me foi ensinado o discurso na primeira pessoa, de uma situação, ou de um sentimento, vivido pelo autor do texto, que fosse um sentimento envolvente, aliás, um sentimento que nos retira toda ou quase, a possibilidade de uma análise objectiva. Lembro-me, porém do livro de José Cardoso Pires sobre a sua experiência de quase-morte e passagem para o outro lado, e regresso à vida, infelizmente por pouco tempo. Foi, seguramente, uma experiência, e o texto confirma-o, única, intensa e extremamente difícil de contextualizar, e de passar em testemunho descrito. Pelo próprio.

Mas hoje, como nos últimos tempos, Morfeu recusa-se a chamar-me para o seu abraço aconchegante, que nos leva, ao seu colo, por viagens insuspeitas e normalmente sem testemunho confirmável. Morfeu tem-me abandonado. 

Um exercício de vivência pessoal, em forma de letras, para testar a que ponto a falta de distanciamento, que aos escritores se aconselha, pode perturbar o mesmo.

A minha formação familiar não se pautou pela educação das sensibilidades, pelas sensibilidades e muito menos pela transmissão de sentimentos, por palavra viva e em discurso directo. Menos ainda que se advogasse a sensatez de escrever sobre uma experiência intensa, perturbadora, em dois sentidos inversos, na euforia e na depressão, para que me torne mais claro. A minha formação, que os meus amados pais me passaram não se compadecia muito de, palavras minhas, lamechices. Mas a vida levou-me por outros caminhos, até outras pessoas e, pouco a pouco a expressão dos sentimentos foi para mim um mundo novo, assumido e verbalizado.

É de amor que vos venho falar. Esse sentimento tão nobre, quanto mortal. Tão efervescente, quanto desmoralizador, um veneno para a mente. Os venenos, como todos sabemos, são-nos bons ou muito maus, sendo a dose e o momento que determinam a letalidade, ou a tonicidade. O Amor é um tónico. Sem dúvida. Todos o sabemos, ou julgamos saber. Nem todos, porém, sabemos mesmo o seu significado e nem um de nós provavelmente o saberá definir. Enamoramento, paixão, amor...ódio, no reverso, ali mesmo ao dobrar da esquina. O fármaco que nos salva a vida ou o veneno que no-la tira.

De amor se diz habitar no coração. Mas no coração corre sangue. O sentimento vem de cima, onde habita também o ódio, portas meias com a outra face da moeda que manda mais em nós...

De um ápice se passa de...

Um estrépito que nos sobe pelo peito, nos aquece, o tremor, o estômago que mal se aguenta, os intestinos...os calores e os tremores de frio, um tampão para as palavras que têm de ser ditas, a voz que se embaça, a garganta que aperta, a relatividade dos tempos, tão lento antes de chegar, tão rápido quando estamos com o nosso amor... a paixão que nos queima, os momentos loucos que nunca chegam, e tão leves e diáfanos se vão, os corpos que se querem, os beijos que nunca são demais, o fogo, as lágrimas de felicidade, a promessa da eternidade, os exageros, os excessos, a segurança, a serenidade, a paz, a coragem, o mundo que deixa de existir, mas que faz todo o sentido que exista. Para sempre!

Num dia, a eternidade, as juras, as certezas. No outro...

Um peso que não nos deixa, o vazio esmagador, o silêncio que nos ensurdece, a incompreensão, a injustiça, a impossibilidade do abandono, o choro, o medo, o frio, o gelo, a perda de apetite, a desistência de tudo, a apatia, a inépcia, as lágrimas que persistem, os exageros, os excessos, o mundo que deixa de existir, mas que não faz sentido que exista mesmo. Para sempre...

O Amor é o maior sentimento do mundo. Não há corpo que o albergue todo. Quando está e...quando desaparece. Tanto nos enchemos de euforia, como do peso da tristeza e dor.

O Amor que nos domina, e nos faz ter medo dele.

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