Estalo


A grande estalada começa no primeiro sopro. Ou vem com ele. E nunca mais pára. Vem-nos dia a dia em doses certas e subtilmente. Chega-nos de muitos e todos os lados, e apanha-nos no nosso melhor. Muitos de nós livram-se bem desse estalo incomensurável, e andam por aqui como se nada lhes tocasse. E não toca. Só atinge os infectados. Os infectados pela vida, pela vontade de fazer, de sentir e fazer sentir, de ter e de pertencer. Só atinge os incuráveis infectados, contagiados um dia e nunca mais certos pelo passo normal, diria sensato, dos ‘realistas’, dos ‘pragmáticos’, dos ‘normais’.

Tresmalhados, alguns, somos os infectados pela sensibilidade, pela energia inesgotável, pela vontade de aperfeiçoamento, pela mania estúpida de ser diferente para ser melhor. Melhor por melhor, nada que tenha de entrar em comparações com esses cansativos e chatos dos realistas. Não. Apenas infectados, pela VIDA. Até morrer, que nada se relata mais a partir desse dia, do estalo último. 

Acreditamos na vida, nas pessoas, na sinceridade, no humanismo, na honestidade, como um conto infantil que nos deixa encantados e cegos e....susceptíveis ao grande estalo da vida. Levamos com o ‘estalo’ em doses certas, mas pequeninas e repartidas para que dele não nos demos conta e, assim, não nos possamos desviar.

De tanto querer...tudo se perderá, como no aforismo. Dizem de alguns de nós que somos especiais, somos diferentes, até melhores e até super...e só depois entendemos que se trata de mais um estalo e uma partida. Ah! Até creio, digo eu, que pode ser. Seremos especiais, queridos e, uma vez por outra, num extremo e impensado devaneio de alguém, desejados. Somos bons? Talvez. Melhores, seguramente. E nada disso serve de alguma coisa a alguém.

E somos tantos, tantos mas julgamos que somos...só nós. 

E ficamos sempre, um dia, sempre..sós.


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