A doença da democracia


A Democracia hoje instituída em todos os países europeus, nos que fazem parte da União Europeia e em mais alguns que não, e menos outros que se dizem democratas e nem sombras disso o são, está pouco a pouco a ser questionada, discutida, levada em polémicas que, esperemos, conduzam a alguma forma de governo e administração política mais saudável, mais representativa e menos arrogante ou, até, corrupta.

Esta forma de Democracia pouco tem a ver com a instituição política original grega, nem havia vantagem nisso, pois na Grécia antiga a democracia era-o só para alguns, mas dentro desse restrito grupo de privilegiados era um autêntica representação dos interesses e vontades de todos.

As nossas democracias actuais são uma evolução que foi, gradualmente, surgindo após o século das luzes. Após os grandes filósofos políticos e sociais como Kant, Espinosa, Voltaire, Rosseau, Montesquieu, Hume, Locke, Diderot, Lessing, Smith e até Marquês de Pombal mas muitos também outros terem lançado um imenso movimento de renovação ideológica sobre as monarquias ditas esclarecidas – que deviam ser por uma vez mais cultas e melhores ouvintes da vontade do povo - sobre os direitos dos humanos e sobre a nobreza do humanismo individual através do respeito pela natureza de que somos todos feitos, sobre, afinal o direito der sermos iguais à nascença e mais tarde perante a justiça e a lei.

A forma institucionalizada destas nossas democracias foi posta em prática tal como hoje conhecemos, em França, onde ainda assim sofreu muitas convulsões, e no reino Unido, onde mantém o mesmo formato desde há séculos.

Hoje a Europa sente-se e diz um bastião da democracia. Mas cada vez põe mais em causa a forma de governo que institucionalizou.

A Europa e a Democracia estão doentes e nem sempre se dão conta disso. A classe política acha-se a eterna e legítima representante dos povos que a elegem, mas logo de seguida só procuram o poder monárquico de subversão dos princípios de que se dizem defensores. O poder político da Europa está hoje entregue a pessoas que nada entendem de Democracia. Podem sabê-lo histórica e culturalmente, mas não o praticam. A Europa e muitos Estados-membros, designação ridícula que se dá a cada Estado que faz parte desta União Europeia a entrar em decadência, usam do poder que têm para mandar em vez de administrar, impor em vez de propor, fiscalizar em vez de fazer a prevenção, policiar em vez de proteger. A arrogância política grassa por toda a Europa, sentindo-se mais, como sempre, nos países latinos. Os governantes que são, ou deviam ser, segundo os princípios democráticos, funcionários do povo eleitor, administradores do Estado mandatados pelos seus povos, sentem-se com direitos de proprietários do Estado, com poderes nunca antes alcançados nem em certas ditaduras.

Instituem-se coisas aberrantes como uma ASAE, que devia proteger o cidadão e o agride, e ainda o confunde, havendo muitos que defendem a sua abjecta actuação - não actividade – fazem-se leis que não defendem as pessoas mas as confrontam e desprotegem ( as normas e directivas europeias como esta da protecção alimentar, estúpida e provocadora lei que nos quer deixar a todos vitimas da assepsia, mesmo ignorando como chegámos até aqui vivos e saudáveis , as normas de segurança que quase nos tiram o prazer das viagens e muitas, muitas mais).
Perseguem-se nos tribunais os cidadãos que pretendem falar livremente tecendo legítimas críticas sobre os seus governantes, realmente incompetentes, arrogantes e, tantas vezes, não premiados com uma réstia de inteligência, que pelo menos de alguma coisa nos sirva, e que seja posta, evidentemente ao nosso serviço, a nós que os elegemos e pagamos…

O Tratado de Lisboa, como Sócrates gosta que lhe chamem, sentindo que foi obra sua, um Tratado que mais é, à boa imagem da sua pessoa e limitada cabeça, uma manta de retalhos e que em abono da verdade serve bem mais a classe política e suas instituições do que os interesses dos povos, foi chumbado há três dias na Irlanda.

Mas os políticos magos que temos, de que Durão Barroso é um dos seus mais fiéis representantes, vieram logo dizer que não está nada perdido. A Irlanda é que se irá tramar. A Irlanda é que não entendeu nada. A Irlanda não é tão iluminada como os outros e nem imagina como ficará a perder. A Irlanda não conta. A magia subversiva - e não há legitimamente outro termo, quando um povo decide num dado sentido e um governante lhe altera o sentido da decisão, que chamar-lhe subversivo e, além disso ilícito - irá encontrar uma solução e um contorno à decisão do povo Irlandês, que teve a ousadia de ir contra a vontade dos outros povos - onde não existiu qualquer referendo, mas votações em ciclo fechado.

Resta-nos a eterna interrogação. Se do Tratado quase ninguém sabe nada, excepto concretamente o povo irlandês pelo processo de divulgação que exigiu o referendo, quem tem razão afinal? E a quem serve este Tratado, no fundo.

Com o chumbo irlandês, levantou-se uma vez mais a questão de se a classe política europeia não anda mais a usar e abusar de poderes que nem devia ter, do que a verdadeiramente lavrar no sentido de nos fazer um dia vivermos melhor e com mais futuro. A Irlanda, esse país que no espaço de tempo idêntico a Portugal e Espanha se tornou um dos mais ricos da Europa, fazendo precisamente aquilo que há anos venho defendendo e é o oposto ao que os nossos ilustres, economistas e políticos defendem, abaixamento de impostos para resolver problemas micro e macro económicos, esta Irlanda do novo milagre económica, que teve um crescimento do seu PIB comparável ao dos países, ainda pobres, do sudoeste asiático, deu-nos uma grande lição.

Uma lição de defesa dos seus legítimos interesses e vontade e da sua capacidade de insurgência contra quem atenta contra os mesmos. E nós, tristes portugueses, que deixamos o maior arrogante e mais evidente incompetente a governar sempre, em tudo o que faz, contra quem o elegeu, fazemos…nada.
Perdão, damos-lhe ainda a vantagem nas sondagens.
Uma perda de tempo para nós e uma vergonha internacional.

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